quinta-feira, 30 de setembro de 2021

O dia da Reforma e o sacerdócio de todos os crentes.

 



Para muitos estudiosos da Reforma Protestante do século XVI, as ênfases centrais desse movimento foram cinco: só Cristo (solus Christus), só a Bíblia (sola Scriptura), só a graça (sola gratia), só a fé (sola fide) e só a glória de Deus (soli Deo gloria). Todavia, há boa base para afirmar que, além dessas ênfases fundamentais, os reformadores também reservaram um lugar de destaque para uma doutrina que (por razões que daremos mais adiante) poderia ser considerada a Cinderela tanto da Reforma clássica como do movimento evangélico no tempo presente. Refiro-me à doutrina do sacerdócio de todos os crentes, também chamado de sacerdócio universal ou comum.

Quando Martinho Lutero lançou seu desafio de reforma da Igreja Católica Romana, ele não o fez animado por um espírito de inovação ou rebeldia, mas movido por convicções enraizadas na Palavra de Deus. Na doutrina da justificação pela fé ele encontrou a base para a solidariedade inalterável dos cristãos entre si, que tornava impossível a divisão tradicional entre “eclesiásticos” (o clero) e “seculares” (os leigos). Parafraseando Gálatas 3.28: “Não existe nem sacerdote nem leigo, pároco nem vigário, ricos nem pobres, beneditinos, espiritanos, freis menores nem agostinianos, porque não está em questão ter este ou aquele estado, grau ou ordem.” Em seus memoráveis tratados de 1520, o famoso reformador elabora esse conceito com uma orientação predominantemente cristológica. Ele alega que Cristo é nosso irmão maior, e que todos os cristãos participam da glória e da dignidade que correspondem a essa relação como reis e sacerdotes com Cristo. Todo cristão é sacerdote pelo simples fato de ser cristão. Ele escreve:

Um sapateiro, um ferreiro ou um lavrador têm cada um a função e a obra de seu ofício. Não obstante, todos são igualmente sacerdotes e bispos ordenados, cada um com sua função ou obra útil para o serviço do outro, de modo que as várias obras estão voltadas para a comunidade, para favorecer o corpo e a alma, assim como os membros do corpo físico servem todos uns aos outros.

A conclusão é que todo cristão tem um “serviço sacrificial”, que não é a missa (já que a missa não inclui o oferecimento de um sacrifício), mas um ofício por meio do qual ele expressa seu louvor e obediência a Deus. O cristão tem, além disso, um ministério de intercessão e o “poder de apontar e julgar o que é correto e incorreto na fé”. Lutero não nega o papel que desempenha o ministério de administração e ensino dentro da igreja. Contudo, ele afirma que a única autoridade que os pastores e mestres têm é a que deriva da Palavra de Deus e que, em consequência, todo cristão tem a capacidade de julgar segundo as Escrituras e de rejeitar todo ensino que contradiz o que as Escrituras ensinam. Ele argumenta:

Se Deus falou contra um profeta por meio de um burro, por que não pode falar contra o papa por meio de um homem bom? Paulo repreendeu Pedro por estar equivocado. Disso se conclui que cabe a todo cristão preocupar-se com a fé, entendê-la e defendê-la, e condenar todos os erros.

A mesma doutrina do sacerdócio de todos os crentes tem lugar na obra monumental de João Calvino, as Institutas da religião cristã, e em outras obras dos reformadores. A Reforma não foi apenas a redescoberta de que “o justo viverá pela fé”, que resume um aspecto central do ensino evangélico sobre a salvação, relacionado com as cinco ênfases da Reforma mencionadas acima. Ela foi também um retorno ao início de uma eclesiologia enraizada na obra de Jesus Cristo, que, por amor, “fez de nós um reino de sacerdotes a fim de servirmos ao sei Deus e Pai” (Ap 1.6).

Desse ponto de vista, não se faz justiça aos reformadores quando se entende que sua motivação foi colocar “por cima da igreja e sua tradição, sua interpretação pessoal e subjetiva das Escrituras”, como afirma Hans Küng. A intenção que motivou os reformadores foi, antes, colocar a igreja sob o juízo da Palavra de Deus, chamá-la de volta das tradições humanas para a liberdade do evangelho.

Cabe acrescentar, no entanto, que a Reforma clássica ficou aquém das expectativas no que tange às consequências práticas do sacerdócio de todos os crentes para a vida e missão da igreja. Como John Yoder assinalou, “a maior parte da reflexão protestante sobre o sacerdócio de todos os crentes não resultou em estruturas para implementar a visão apostólica de que cada membro da igreja tem seu dom ministerial”. Em termos concretos, nas igrejas protestantes em geral prevaleceu a dicotomia entre os clérigos que exercem seu dom ministerial e os leigos que nem conhecem seus dons ministeriais nem se preocupam em descobri-los e exercê-los para o bem comum, em conformidade com o ensino bíblico (ver especialmente 1Co 12.1-31 e Rm 12.3-8). É a expressão eclesiástica da dicotomia entre o sagrado e o secular que leva a uma distorção lamentável do cristianismo, especialmente no que diz respeito à ética.

No contexto latino-americano, o movimento das comunidades eclesiais de base foi uma tentativa valiosa de recuperar uma eclesiologia enraizada no Novo Testamento, uma eclesiologia que superou a dicotomia entre clero e leigos e recuperou a dimensão essencialmente comunitária da igreja. Leonardo Boff entendeu essa mudança como uma eclesiogênese, um novo nascimento da igreja. Sem voltas nem rodeios, ele afirmou que “as comunidades de base reinventam a igreja”. Elas a reinventam, segundo o famoso teólogo, não como “expansão do sistema eclesiástico vigente, assentado sobre o eixo sacramental e clerical”, mas como “uma forma diferente de ser igreja, baseada sobre o eixo da Palavra e do leigo”, ou seja, sobre o mesmo eixo que os reformadores propuseram como base para o sacerdócio de todos os crentes. Não é de surpreender, portanto, que várias das características da igreja, segundo a “nova eclesiologia” que Boff descreve, coincidam em termos gerais com as da igreja com que sonhavam os reformadores:

- Igreja – povo de Deus;

- Igreja em que os leigos são “verdadeiros criadores da realidade eclesial, do testemunho comunitário, da organização e da responsabilidade missionária”;

- Igreja como “koinonia de poder”, “contrária ao princípio de monopolização do poder nas mãos de um corpo de especialistas, por cima e por fora da comunidade”;

- Igreja em que “toda a comunidade é ministerial, não só alguns dos seus membros; dessa forma supera-se a rigidez do trabalho religioso: hierarquia/direção, laicato/execução”;

- Igreja de diáspora que se faz presente na sociedade civil, “disseminada dentro do tecido social”, gerando “uma mística de ajuda mútua”;

- Igreja libertadora, “porta de entrada (do ponto de vista do povo) para a política como compromisso e prática em busca do bem comum e da justiça social”;

- Igreja que “prolonga a grande tradição”, de Jesus, dos apóstolos e das primeiras comunidades cristãs, que tem como eixo articulador “a Palavra de Deus ouvida e lida no contexto dos seus problemas, a execução das tarefas comunitárias, a ajuda mútua e as celebrações”;

- Igreja que “constitui a unidade a partir da missão libertadora”, não a partir de um governo hierárquico, um “poder centralizador [...] que chega a expropriar o povo cristão de todas as formas de participação decisória”;

- Igreja com uma nova compreensão da sua universalidade, universalidade esta que leva a sério as causas universais, como “a libertação econômica, social e política que abre a perspectiva para uma libertação plena no reino de Deus”;

- Igreja “toda ela apostólica”, já que “todo enviado (e todo batizado recebe a tarefa de anunciar e testemunhar a novidade de Deus em Jesus Cristo) é um apóstolo e continua o envio dos primeiros doze apóstolos”.

Lamentavelmente, o próprio Vaticano se encarregou de criar obstáculos e, finalmente, de impedir o crescimento de um movimento que tinha o potencial de injetar vida nova na Igreja Católica Romana.

Cabe acrescentar, no entanto, que é igualmente lamentável o crescimento atual do clericalismo em círculos evangélicos na América Latina e em outras regiões do mundo, com o surgimento de pastores e apóstolos que monopolizam o poder e desconhecem a liderança de serviço. Quanta falta faz uma nova Reforma, que torne possível uma eclesiogênese evangélica que tenha como eixo a Palavra de Deus e o laicato, e reconheça em termos práticos a importância do sacerdócio de todos os crentes para a vida e missão da igreja!

Traduzido por Hans Udo Fuchs.

OS PRINCÍPIOS BÁSICOS DA REFORMA DO SÉCULO XVI

 



A Reforma do século XVI foi uma volta às Escrituras Sagradas, um retorno à doutrina apostólica. Podemos sintetizar as ênfases da Reforma em cinco pontos distintos e axiais:
1. Sola Scriptura – Só as Escrituras – Os reformadores reafirmaram a supremacia das Escrituras sobre a tradição. A Bíblia é a única regra normativa de fé e conduta. Todas as doutrinas e ensinos forâneos ou estranhos às Escrituras devem ser rejeitados. A autoridade da igreja precisa estar debaixo da autoridade das Escrituras. Nenhum dogma ou experiência pode ser aceito se não tiver base na Palavra de Deus. Eis o que diz o artigo V da Confissão da Igreja Reformada da França, adotada em 1559: “Não é lícito aos homens, nem mesmo aos anjos, fazer, nas Santas Escrituras, qualquer acréscimo, diminuição ou mudança. Por conseguinte, nem a antiguidade, nem os costumes, nem a multidão, nem a sabedoria humana, nem os pensamentos, nem as sentenças, nem os editos, nem os decretos, nem os concílios, nem as visões, nem os milagres, devem contrapor-se a estas santas escrituras; mas, ao contrário, por elas é que todas as coisas se devem examinar, regular e reformar”.
2. Sola Fide – Só a Fé – Os reformadores sublinhavam também a supremacia da fé sobre as obras para a salvação. A salvação não é mérito humano, conquistado pela prática de boas obras, mas é obra de Deus, recebida de graça pelo homem mediante a fé em Cristo. A salvação não resulta da somatória de fé mais obras. A salvação é dom de Deus, recebida exclusivamente pela fé.
3. Sola Gratia – Só a Graça – Os reformadores reafirmaram a doutrina apostólica de que somos salvos pela graça. A graça é um dom imerecido de Deus a nós. O salário do pecado é a morte. Merecemos o juízo, a condenação, o inferno, mas Deus, pela sua infinita misericórdia, suspende o castigo que merecíamos e nos dá a salvação, que não merecemos. Isso é graça!
4. Solo Christu – Só Cristo – Os reformadores rejeitaram peremptoriamente a autoridade do papa sobre a igreja. O papa usurpa o lugar da Trindade. Ele usurpa o lugar de Deus Pai ao ser chamado de Pai da Igreja (Mt 23:9). Ele usurpa o lugar de Deus Filho ao ser chamado Sumo Pontífice (Supremo Mediador). A Bíblia diz que há um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo (1 Tm 2:5). Ele ainda usurpa o lugar de Cristo quando ele se auto-intitula a pedra fundamental da igreja sobre a qual a igreja foi edificada. Cristo e não Pedro é a pedra fundamental da igreja (Mt 16:18; At 4:11-12; 1 Co 10:4; 1 Pe 2:6-8). Além do mais, o papa não é um sucessor de Pedro, visto que não existe sucessão apostólica. Finalmente, o papa usurpa o lugar do Espírito Santo, quando se autoproclama o Vigário de Cristo na terra (o substituo de Cristo na terra). Essa posição é exclusiva do Espírito Santo (Jo 14:16-17; 16:7-14). O Espírito é o outro consolador que veio ficar para sempre com a igreja. Assim, a reforma resgatou a verdade infalível da supremacia de Cristo como o nosso salvador, mediador e rei. Por causa da obra de Cristo todos os salvos são sacerdotes reais. O sacerdócio universal dos crentes é uma verdade consoladora. Todos temos livre acesso à presença de Deus, por meio de Cristo. Desta forma, cai por terra toda hierarquia espiritual no Reino de Deus.
Soli Deo Gloria – Só a Deus a Glória – Os reformadores reafirmaram a doutrina bíblica de que Deus não reparte sua glória com ninguém. Somente ele deve ser adorado e honrado. Toda glória que é dada ao homem é vanglória, é glória vazia.

Rev. Hernandes Dias Lopes.

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Universo 25

 




O experimento "Universo 25" é um dos experimentos mais aterrorizantes da história da ciência, que, por meio do comportamento de uma colônia de camundongos, é uma tentativa dos cientistas de explicar as sociedades humanas. A ideia do "Universo 25" surgiu do cientista americano John Calhoun, que criou um "mundo ideal" no qual centenas de ratos viveriam e se reproduziriam. Mais especificamente, Calhoun construiu o chamado "Paraíso dos Ratos", um espaço especialmente projetado onde os roedores tinham abundância de comida e água, além de um amplo espaço para viver. No início, ele colocou quatro pares de camundongos que em pouco tempo começaram a se reproduzir, resultando em um rápido crescimento populacional. No entanto, após 315 dias sua reprodução começou a diminuir significativamente. Quando o número de roedores chegou a 600, formou-se uma hierarquia entre eles e surgiram os chamados "desgraçados". Os roedores maiores começaram a atacar o grupo, com o resultado que muitos machos começaram a "entrar em colapso" psicologicamente. Como resultado, as fêmeas não se protegeram e, por sua vez, tornaram-se agressivas com seus filhotes. Com o passar do tempo, as fêmeas mostraram comportamentos cada vez mais agressivos, elementos de isolamento e falta de humor reprodutivo. Houve uma baixa taxa de natalidade e, ao mesmo tempo, um aumento da mortalidade em roedores mais jovens. Então, apareceu uma nova classe de roedores machos, os chamados "ratos bonitos". Eles se recusaram a acasalar com as fêmeas ou a "lutar" por seu espaço. Tudo o que importava era comer e dormir. A certa altura, "belos machos" e "fêmeas isoladas" constituíam a maioria da população. De acordo com Calhoun, a fase da morte consistia em duas fases: a "primeira morte" e a "segunda morte". O primeiro foi caracterizado pela perda de propósito na vida além da mera existência - nenhum desejo de acasalar, criar jovens ou estabelecer um papel na sociedade. Com o passar do tempo, a mortalidade juvenil atingiu 100% e a reprodução chegou a zero. Entre os camundongos ameaçados, a homossexualidade foi observada e, ao mesmo tempo, o canibalismo aumentou, apesar de haver fartura de comida. Dois anos após o início do experimento, nasceu o último bebê da colônia. Em 1973, ele havia matado o último rato do Universo 25. John Calhoun repetiu o mesmo experimento mais 25 vezes, e todas as vezes o resultado foi o mesmo.

O trabalho científico de Calhoun tem sido usado como um modelo para interpretar o colapso social, e sua pesquisa serve como um ponto focal para o estudo da sociologia urbana.

Atualmente, estamos testemunhando paralelos diretos na sociedade de hoje ... homens fracos e feminizados com pouca ou nenhuma habilidade e nenhum instinto de proteção, e mulheres excessivamente agitadas e agressivas sem instintos maternos.

quarta-feira, 8 de setembro de 2021

A Falência dos relacionamentos.

 


 



Como relacionamentos são difíceis...


Um dia a filha adolescente chegou em casa muito zangada da escola. Sua mãe procurou conversar com ela, mas ela estava tão irritada que entrou no seu quarto e não quis abrir a porta. Quando o pai chegou, e soube do fato, ele, prudentemente, bateu na porta do quarto pedindo para entrar, mas ela disse: - “Vai embora”. Ele insistiu: - “Filha, o que aconteceu. Abra a porta pra conversarmos. O que foi que fizemos?”. Ela respondeu: “-Vai embora porque você é gente e eu odeio gente”. 


Paul Tripp no seu livro “Relacionamentos” afirma: “Somos pecadores capazes de causar grandes danos a nós mesmos e aos nossos relacionamentos. Necessitamos da graça de Deus para nos salvar de nós mesmos. Mas também somos filhos de Deus, providos de grande esperança e potencial. Relacionamentos serão sempre forjados no fogo da batalha.” 


Apesar das lutas que podemos ter é importante lembrar que as portas sempre se abrem por meio de relacionamentos. É por meio de relacionamentos que temos os melhores momentos de nossa história, damos risadas, crescemos em maturidade e somos protegidos e cuidados. Infelizmente também, a maioria das dores, traumas, conflitos, decepções, neuroses, distúrbios psiquiátricos se dão por relacionamentos disfuncionais, traição e injustiça.


Certa vez conversei com alguém que me relatou o seguinte: “Eu não sei mais o que fazer com meu irmão. Ele é desequilibrado e parece que a cabeça dele tem uma rotação fora do eixo, e uma forma de pensar que não faz sentido. Não tenho conseguido sequer ficar no mesmo ambiente onde ele está. Eu não vou a casa minha mãe no horário que ele está. Eu me sinto mal com isto, mas é o único jeito de não me ferir mais”. 


Nem sempre é possível se relacionar com todas as pessoas, até mesmo a Bíblia que é um livro de relacionamentos, reconhece esta verdade ao afirmar: “Se possível, quanto depender de vós, tende paz com todos os homens”. É importante investir nos relacionamentos, o quanto for possível, mas nem sempre é possível ter paz, porque simplesmente existem pessoas absolutamente psicopatas, manipulativas, querem sempre tirar proveito, explorar, mentir, enganar e chegam a um ponto em que não se pode mais confiar.


Mas não deixe de preservar e lutar por seus relacionamentos. Muitas vezes encontramos obstáculos, ficamos cansados e irritados, mas ainda assim, a única forma de sermos tratados, é por meio de pessoas que nos ajudam e se tornam nossos referenciais. E Deus sempre coloca pessoas assim na nossa história.

Rev Samuel Vieira.

CORONEL JOÃO DOURADO (1854-1927)

Alderi Souza de Matos João da Silva Dourado nasceu em Caetité, sul da Bahia, no dia 7 de janeiro de 1854. Era filho de João José da Silva Do...